Dra. Fernanda Santos Belem

Qual médico que cuida da pressão alta na gravidez?

A pressão alta na gravidez, ou hipertensão arterial na gestante, pode acontecer de diversas formas. Quem cuida de pacientes com essa condição é o obstetra com experiência em gestação de alto risco. Em alguns casos é possível que um cardiologista ou clínico geral possam acompanhar em conjunto ao obstetra, mas nem sempre é necessário.

Como saber se eu tenho pressão alta?

A pressão arterial deve ser medida em toda consulta de pré natal. A depender dos sintomas e da presença de alguma doença, as consultas podem ocorrer de forma mais frequente. No final da gravidez elas chegam a ocorrer semanalmente, ou até mesmo com intervalo menor.

Para fazer o diagnóstico de pressão alta a paciente precisa apresentar uma medição de pressão acima de 140x90mmHg (padrão de medida). Essa medição é feita com um aparelho chamado de esfigmomanômetro. Existem diversas tipos:

  • Manual, e para medir é preciso apertar a borracha que insufla enquanto se ouve os batimentos;
  • De pulso, mais comum de ser usado na casa das pessoas;
  • Eletrônico de braço, que é o mais confiável de todos, tendo seu uso difundido em consultórios e hospitais. 
Aparelho de aferição de pressão (enfigmomanômetro) eletrônico de braço.

Para a medida ser assertiva é importante que a paciente esteja sentada, alguns minutos em repouso e com os pés apoiados no chão. A altura do braço também influencia, assim como não estar com a bexiga cheia ou pernas cruzadas. Para confirmar uma medida elevada o ideal é que seja repetida após algumas horas (ou em outro dia). Porém, medidas acima de 160×110 mmHg já necessitam de atitudes imediatas e devem ser consideras.

Quais os tipos de pressão alta na gravidez?

São basicamente 4 tipos:

  • Hipertensão arterial crônica;
  • Pré eclâmpsia;
  • Hipertensão arterial crônica com Pré eclâmpsia sobreposta;
  • Hipertensão gestacional.

É importante salientar que há mais de um tipo de classificação a depender da linha acadêmica, mas essa é uma classificação amplamente aceita.

Hipertensão Arterial Crônica na gravidez

Diagnóstico

O diagnóstico dessa condição pode acontecer antes mesmo de a paciente engravidar. Mas muitas vezes a paciente sem conhecimento prévio, começa a apresentar medidas de pressão elevadas nas primeiras consultas de pré natal. Essa paciente então já se apresenta com pressão alta na gravidez desde o início da gestação, antes das 20 semanas.

Para quem já tem hipertensão arterial crônica, é fundamental que, antes mesmo de engravidar, a paciente faça um ajuste para medicações permitidas na gravidez. Além disso, é fundamental um adequado controle da pressão, assim como investigação e manejo de possíveis complicações, como alterações cardíacas, dos rins e até mesmo dos olhos.

Clique aqui para ler mais sobre a importância de consulta pré concepcional.

Tratamento

O tratamento da hipertensão arterial cronica sempre vai depender de cada caso. Inicialmente, uma alimentação com controle de sal é fundamental. Isso não significa uma dieta sem sal, mas o excesso sempre é perigoso. Além disso, controle de peso e a realização de atividade física (após liberação e avaliação médica) são poderosos aliados. 

Para todos verem: frutas, halter azul e fita métrica representando estilo de vida saudável

Quando for necessário o uso de medicamentos, converse sempre com seu obstetra para entender a segurança desses na gestação. E lembre-se, o bom controle da pressão irá trazer ótimos benefícios para a sua saúde e do seu bebê, então siga à risca as recomendações.

Descrição da imagem: caixa de comprimidos transparente com separação por dia da semana, com comprimidos coloridos.

Acompanhamento da gestante com pressão alta

Pacientes com pressão alta precisam de acompanhamento com obstetra em gestação de alto risco. Isso porque, além de saber manejar os anti hipertensivos, essas pacientes apresentam maior risco para algumas complicações, como pré eclâmpsia e restrição de crescimento fetal. Por isso, saber fazer o seguimento de do bem estar do bebê, além de estar atualizado na medidas que podem diminuir o risco de surgir pré eclâmpsia são mandatórios, mas falaremos disso mais a frente.

É importante lembrar que, principalmente acima de 20 semanas, se houver qualquer um desses sintomas, é fundamental procurar um serviço de urgência, pois podem ser sintomas de pressão alta da gravidez com complicações:

  • Dor de cabeça;
  • Náuseas e vômitos;
  • Dor de estômago;
  • Visualização de pontinhos brilhantes;
  • Falta de ar ou dor no peito;
  • Mal estar e tontura.

Parto na paciente com hipertensão arterial crônica

Apesar de ser uma gestação de alto risco, a paciente que apresentar um bom controle pode ter parto normal. Fazendo um seguimento de vitalidade fetal e da pressão mais próximo, principalmente no final da gestação, é possível aguardar o trabalho de parto. Se houver alguma piora ou a paciente atingir 40 semanas, aí é já não é possível mais continuar esperando. Porém, caso haja condição segura é possível realizar a indução do parto,em uma tentativa de parto normal.

Nesse caso é fundamental lembrar que, após o parto, a paciente deve continuar tomando remédios para a pressão e monitorando a mesma. Apesar de pouco frequente, o descontrole da pressão no pós parto também pode ser perigoso.

Pré eclâmpsia

O que é?

A pré eclâmpsia, também conhecida como Doença Hipertensiva Específica da Gravidez (termo antigo cuja abreviação é sinalizada como DHEG), é diagnosticada quando a pressão começa a se elevar a partir das 20 semanas da gravidez. 

Além disso, para confirmar o diagnóstico, é necessário que a paciente apresente perda de proteína pela urina, ou qualquer disfunção de órgão alvo, que será descrita em detalhes mais adiante.

A pré-eclâmpsia, principalmente nos países em desenvolvimento, ainda é uma das principais causas de morte materna e de partos prematuros. Ela acomete em torno de 10% das gestações, podendo se apresentar tanto de forma leve ou grave. Por ser uma doença com riscos de complicações, o diagnóstico preciso e acompanhamento adequado são fundamentais para os melhores desfechos.

Diagnóstico

Para confirmar o diagnóstico alguns exames devem ser solicitados.

Para a perda de proteína na urina, o exame mais confiável é a coleta da proteinúria de 24 horas, ou seja, coleta-se toda a urina em 24 horas da paciente. Quando essa dosagem ultrapassa 0,3 gramas, ou 300 miligramas, no total, ela é considerada positiva e típica da pré eclâmpsia. É possível que esse exame venha normal, mesmo em pacientes com pré eclâmspia. Isso porque a perda de proteína na urina varia conforme o dia, alimentação, controle da pressão e até mesmo repouso, assim como é possível que haja outras causas de perda de urina que não seja pré eclâmpsia.

Descrição da imagem: tubos de coletas de exames de sangue com etiquetas em um suporte próoprio

O inchaço é um sintoma típico que pode nos fazer suspeitar também da pré-eclâmpsia. Apesar de ser algo comum que as gestantes fiquem mais inchadas no fim da gravidez, o inchaço da pré eclâmpsia é mais acentuado e em locais específicos. Ele ocorre não só nas pernas, mas também em mãos e rosto. Assim, a impossibilidade de uso de anéis, assim como inchaço importante na área dos olhos e nariz, além de ganho superior a 1Kg em uma semana, nos faz suspeitar desse diagnóstico.

Disfunções de órgão típicas da pré eclâmpsia.

Além disso, quando a gestante apresenta alguma das disfunções de órgão típicas da pré eclâmpsia, associada a elevação da pressão, consideramos o diagnóstico confirmado independente da perda de proteína na urina: 

  • Restrição de crescimento intrauterino (feto com o percentil abaixo de 10 no ultrassom, ou uma queda expressiva entre um exame e outro);
  • Sintomas como dor de cabeça, dor de estômago ou visualização de pontos brilhantes;
  • Elevação de TGO e TGP (ou AST e ALT, conhecidas como transaminases, acima de 70);
  • Queda de plaquetas (considerada como diagnóstico abaixo de 100 mil);
  • Elevação de desidrogenase lática (DHL acima de 250);
  • Elevação da bilirrubina (com valores totais acima de 2);
  • Diminuição importante da diurese ou elevação da creatinina acima de 1,2, significando uma piora da função do rim;
  • Sintomas como dor torárica ou diagnóstico de edema agudo de pulmão;
  • Convulsão, chamada de eclâmpsia, sem outra causa que a justifica.

Inovações no acompanhamento da pré eclâmpsia

Quando há dúvida diagnóstica, ou é necessário confirmar a possibilidade de uma paciente ter um desfecho adverso devido a pré eclâmpsia, existe um exame capaz de auxiliar. Ele é relativamente novo, comumente conhecido como biomarcadores de pré eclampsia. Ele é composto pela dosagem no sangue do sFlt-1 (soluble fms-like tyrosine kinase-1) e do PlGF (placental growth factor), e o cálculo da relação entre ambos.

Apesar de ser um exame caro, os estudos demonstraram que a sua realização consegue prever os casos mais graves, e assim orientar quais pacientes precisam ficar internadas para acompanhamento. Por conta de tamanha relevâncias, sua cobertura passou a ser prevista no Rol da ANS, ou seja, é obrigatório que todos os convênios cubram sem custo a sua realização entre 20 e 36 semanas de gravidez.

Rastreio de risco e prevenção

Sendo uma condição de saúde tão prevalente, e potencialmente grave, o ideal é conseguir descobrir qual paciente que está sob maior risco de desenvolver pré eclâmspia. Assim, é possível intervir somente no grupo de alto risco, melhorando o desfecho dessas pacientes, sem expor pacientes de baixo risco a tratamento sem necessidade. Atualmente, com novos exames, isso já é possível.

No início do pré natal, entre 11 semanas e 13 semanas e 6 dias, é possível calcular o risco da paciente ter pré-eclâmpsia. Para realizar o cálculo, são utilizados os seguintes parâmetros:

  • História pessoal;
  • História familiar;
  • Dados da gestação;
  • Medida de pressão arterial no dia do ultrassom;
  • Medida de alguns parâmetros de ultrassom, como o doppler da artéria uterina;
  • Dosagem de um exame de sangue chamado PlGF (placental growth factor).

Com todos esses dados o médico ultrassonografista preenche um formulário que calcula qual o risco dessa gestante desenvolver pré eclampsia na gestação. Com o resultado o obstetra consegue planejar o acompanhamento dessa gestante.

imagem de ultrassom em preto e brando de feto com aproximadamente 12 semanas no exame chamado de morfológico de primeiro trimestre
Morfológico de primeiro trimestre, momento ideal para realizar o rastreamento da pré eclâmpsia na gestação

Se a paciente for de alto risco para desenvolver pré eclâmpsia na gestação, existe um tratamento que consideramos profiláticos. Além de totdas as medidas de saúde, uma medicação específica que, quando utilizada entre 12 e 36 semanas, pode diminuir o risco de evento adverso relacionado a pré eclâmpsia. Lembrando que todo tratamento envolve uma decisão que além dos benefícios, deve também considerar possíveis riscos (como contraíndicação ao uso da medicação) e orientações específicas que só podem ser debatidas em consulta médica.

Além disso, para todas as pacientes, a ingestão adequada de cálcio pode ajudar a prevenir a pré -eclâmpsia. Então, em pacientes que possuem baixa ingesta, a suplementação entre 1 e 2 gramas de cálcio é indicada. 

Não podemos esquecer que além dessas intervenções, um estilo de vida saudável com alimentação equilibrada, controle de peso, atividade física (conforme orientação médica e de um profissional da saúde) e diminuição do estress também ajudam a prevenir o aparecimento da pré eclâmpsia

Acompanhamento da gestante com pré eclâmpsia

O acompanhamento com um pré natalista familiarizado com gestação de alto risco é mandatório, já que a pré-eclâmpsia uma condição que aumenta o risco de desfecho adverso materno e fetal.

A Identificação de quadro graves geralmente tem acompanhamento hospitalar com a paciente internada, e o acompanhamento é individualizado.

A avaliação da vitalidade fetal é mandatória, e sua frequência vai depender caso a caso. No geral realizamos exames de ultrassonografia, com doppler (que avalia os fluxos sanguíneos do bebê) e com a avaliação do bem estar fetal (chamado de perfil biofísico fetal). A depender da idade gestacional é associada também a cardiotocografia, para monitorização do bem estar do bebê naquele momento.

Descrição da imagem: exame de cardiotocografia para avaliar bem estar fetal (uma folha rosa com um traçado registrando o batimento cardíaco fetal)

Os anti hipertensivos, remédios que auxiliam no controle da pressão, devem ser escolhidos dentre os que são seguros na gravidez. Algumas classes de medicações são contraindicadas em toda gestação, enquanto outras são evitadas, usando-se apenas em casos selecionados. O seu manejo é sempre individualizado e deve ser discutido com o seu médico.

Outras medicações podem ser necessárias em alguns casos mais graves, como betametasona (corticoide que auxilia o amadurecimento do pulmão em bebês de casos que têm alto risco de nascer nos próximos dias e abaixo de 34 semanas). Além disso, o sulfato de magnésio pode ser usado em casos de pré eclâmpsia grave, em ambiente intra hospitalar com monitorização, geralmente em ambiente de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

No geral, quadros leves devem ser avaliados com consulta semanal, medição da pressão em casa diariamente e coleta de exames laboratorias de forma seriada. O parto deve ser realizado com 37 semanas conforme a maioria dos consensos internacionais, porém há algumas linhas que consideram a possibilidade de prolongar. A via de parto, se normal ou cesárea, sempre a dependerá de cada caso e da avaliação do seu obstetra, não sendo a pré eclâmpsia por si só uma contraindicação de parto normal.

Hipertensão arterial crônica com Pré eclâmpsia sobreposta

Quando uma paciente com hipertensão arteria crônica começa apresentar piora da pressão, a partir de 20 semanas, associada com perda de proteína na urina, ou disfunções de órgão típicas da pré eclâmpsia, consideramos a pré eclâmpsia sobreposta. A pré eclâmpsia acaba sendo mais comum em gestantas com hipertensão arterial crônica, sendo uma frequência maior dos 10% vistos na população geral. É importante acompanhar conforme descrito pela pré eclâmpsia, com atenção redobrada, pois as chances de quadros mais graves também aumenta.

Gestante tendo a pressão medida para investigar de pressão alta na gravidez.

Hipertensão Gestacional

A hipertensão gestacional é diagnosticada quando a pressão arterial começa a subir a partir das 20 semanas, mas diferentemente da pré eclâmpsia, não há proteinúria, edema ou lesão de órgão alvo como descrito acima . É importante ficar atento pois até 25% desses casos podem evoluir como uma pré eclâmpsia. Deve-se também ficar atento no pós parto, pois muitos deles são pacientes com hipertensão arterial crônica mascarada. Isson porque é normal que no início da gestação a pressão arterial caia, e essa queda (que chamamos de fisiológica) mascara uma hipertensão arterial crônica.

Conclusão

Para fazer seu acompanhamento de pré natal, procure um pré natalista que tenha familiaridade com gestações de alto risco, principalmente se você tiver alguma condição associada a hipertensão na gravidez. E lembre-se de um acompanhamento adequado e medição da pressão, pois em alguns casos ela pode começar a se elevar na gravidez, e isso exige cuidados específicos.

Referência:

Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO). Pré-eclâmpsia/ eclâmpsia. São Paulo: FEBRASGO, 2021. (Protocolo FEBRASGO-Obstetrícia, n. 73/ Comissão Nacional Especializada em Gestação de Alto Risco).